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Alterações ao regime de operação portuária e das bases gerais das concessões do serviço público de movimentação de cargas

ALERTA LEGAL — 28 de novembro de 2024

No passado dia 25 de novembro, foi publicado o Decreto-Lei n.º 92/2024, que procede à quarta alteração ao Decreto-Lei n.º 298/93, de 28 de agosto (que estabelece o regime de operação portuária) e à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 324/94, de 30 de dezembro (que aprova as bases gerais das concessões do serviço público de movimentação de cargas em áreas portuárias).

 

Enquadramento das alterações


Reconhecendo, na nota preambular do decreto-lei agora publicado, que a duração das concessões portuárias tem um efeito direto na atratividade e na captação de investimento, o Governo pretende, com esta alteração legislativa, garantir a competitividade das infraestruturas portuárias nacionais, criar condições para tornar efetiva e economicamente viável a modernização dos portos, em termos de digitalização, descarbonização e conectividade, de modo a aumentar a competitividade e o desempenho, e responder às novas exigências do comércio externo.

As alterações legislativas visam harmonizar as regras aplicáveis quanto aos prazos das concessões portuárias de serviço público, que, até aqui, eram objeto de tratamento distinto em relação às concessões de utilização privativa.

Os portos integram o domínio público do património do Estado. A operação portuária, por particulares, dependendo de um ato ou contrato atributivo de direitos da Administração, é uma atividade exercida sob dois modelos distintos, conforme se trate de terminais de serviço público ou de terminais de utilização privativa.

O Decreto-Lei n.º 298/93, agora objeto de alteração, regula, nomeadamente, a exploração, em regime de concessão de serviço público dos terminais portuários (e que pode ou não integrar uma concessão de obras públicas). Até aqui, o prazo máximo da concessão era de 30 anos.

Já a utilização privativa de terminais (i.e., que apenas movimentam cargas da própria empresa e em que não é prestado um serviço ao público) funciona sob o regime de mera utilização dominial, mediante um título de utilização de recursos hídricos, atribuído nos termos da Lei n.º 58/2005, de 29 de dezembro (Lei da Água), o qual, no caso da concessão, pode ter como prazo máximo 75 anos.

Coexistiam então dois prazos distintos de vigência: um aplicável aos terminais de serviço público (30 anos) e outro que visava os terminais portuários de uso privativo (75 anos).

Considerando que as concessões portuárias, pelas suas características, envolvem investimentos avultados, o prazo de 30 anos induzia condições de exploração menos competitivas, no confronto da concessão de serviço público com a concessão de utilização privativa, para além de tal limitação de prazo potenciar uma perda de competitividade do setor portuário português face a regimes jurídicos externos que com ele concorrem (o espanhol, nomeadamente, que prevê desde 2014, a possibilidade de prorrogação dos contratos até 75 anos, em função do investimento realizado, como sinalizou a Autoridade da Mobilidade e dos Transportes, no Memorando n.º 1/2016).

 

Quais as alterações?


Decreto-Lei n.º 298/93, de 28 de agosto

De acordo com a nova redação do artigo 29.º, o prazo máximo das concessões para o serviço público de movimentação de carga foi alterado.

Inicialmente, o prazo máximo era de 30 anos, estabelecido com base nos investimentos em equipamentos e obras portuárias. A nova versão, que entrará em vigor a partir de 30 de novembro, amplia esse prazo para até 75 anos, considerando o tempo necessário para amortização e remuneração do capital investido pelo concessionário, em condições normais de rentabilidade da exploração.

Nos últimos cinco anos do prazo das concessões, a caução anual será aumentada para o dobro, conforme já estava previsto na versão inicial.


Decreto-Lei n.º 324/94, de 30 de dezembro

Este decreto-lei aprova as bases gerais das concessões do serviço público de movimentação de cargas em áreas portuárias.

Agora, o prazo da concessão não pode ser superior a 75 anos (cfr. n.o 1, da Base XIII), por oposição prazo de 30 anos anteriormente previsto.

O prazo do contrato é determinado pelo tempo considerado necessário para amortizar e remunerar o capital investido pelo concessionário, em condições normais de rentabilidade da exploração.

Adicionalmente, a nova redação introduz a possibilidade de prorrogação do prazo inicial da concessão, desde que justificada pela necessidade de assegurar a amortização e a remuneração do capital investido, conforme as condições previstas no artigo 282.º do Código dos Contratos Públicos. No entanto, o prazo inicial da concessão, somado a eventuais prorrogações, não pode exceder o limite de 75 anos.

 

Como funciona a atividade?


A prestação de serviços de movimentação de cargas nas áreas portuárias de serviço público, consiste numa atividade considerada de interesse público e pode ser prestada:

  • Mediante concessão de serviço público a empresas de estiva;
  • Mediante licenciamento;
  • Pela autoridade portuária.

O regime de licenciamento apenas terá aplicação quando, tendo sido efetuada consulta prévia às empresas de estiva em atividade, se verifique, comprovadamente, por despacho fundamentado do Ministro do Mar, a possibilidade de o concurso ficar deserto ou se reconheça, por resolução do Conselho de Ministros, a existência de interesse estratégico para a economia nacional na manutenção deste regime.

Por outro lado, a autoridade portuária apenas pode exercer diretamente a atividade de operação portuária em caso de insuficiente prestação de serviço por empresa de estiva ou para assegurar a livre concorrência, devendo neste caso ser previamente ouvida a Direcção-Geral de Concorrência e Preços.

Já os titulares de direitos de uso privativo de parcelas do domínio público, de concessões de exploração de bens dominiais, de concessões de serviço público ou de obras públicas portuárias, podem realizar livremente, na área que lhes está afeta, operações de movimentação de cargas, desde que as mercadorias provenham ou se destinem ao seu próprio estabelecimento industrial e as operações se enquadrem no exercício normal da atividade prevista no respetivo título de uso privativo ou no objeto da concessão.

Assim, a movimentação de cargas em cais ou terminais é, geralmente, atribuída a empresas de estiva através de concessão de serviço público, a qual pode também integrar uma concessão de obras públicas.

A atribuição das concessões é feita por concurso, com base num programa e caderno de encargos definidos pelas autoridades portuárias e aprovados pelos ministros competentes.

As empresas ou outras entidades não licenciadas como empresas de estiva, podem ser oponentes aos concursos de adjudicação de concessões, desde que cumpram todas as condições previstas para o exercício da atividade e se comprometam a preencher todos os requisitos legais e regulamentares para o acesso à atividade em caso de adjudicação, previstas no artigo 9º do regime jurídico em análise.

 

Âmbito de aplicação das alterações


As alterações ao prazo de vigência dos contratos de concessão de serviço público de movimentação de cargas em áreas portuárias aplicam-se aos contratos em execução ou a celebrar e aos procedimentos de formação de contratos iniciados ou a iniciar, sendo expectável que, em face da urgência em melhorar as infraestruturas portuárias, sejam revistos os termos dos contratos de concessão em vigor de forma a possibilitar um reforço do investimento privado.