Foi publicado, no passado dia 08 de janeiro, o Decreto-Lei n.º 10/2024, que aprova as muito aguardadas medidas de simplificação administrativa em matéria de urbanismo e ordenamento do território, no âmbito do programa transversal SIMPLEX.
No quadro do SIMPLEX, já concretizado na área do ambiente através do Decreto-Lei n.º 11/2023, de 10 de fevereiro, elegeu-se como prioridade a simplificação da atividade administrativa através da contínua eliminação de licenças, autorizações e atos administrativos desnecessários, numa lógica de “licenciamento zero”.
O presente diploma, a par com outras medidas aplicáveis a toda a Administração Pública e a todos os procedimentos relacionados com o exercício da função administrativa, o que faz é concretizar o SIMPLEX nos procedimentos de controlo prévio de projetos na área do urbanismo e ordenamento do território, tendo como objetivo declarado acabar com as exigências administrativas e outras barreiras que o legislador considera desproporcionais para o efeito, consagrando-se, designadamente, novos casos de comunicação prévia, de isenção e de “dispensa” de controlo prévio.
Por outro lado, pretende-se uma verdadeira uniformização das práticas e procedimentos por cada município, de modo a evitar tratamentos injustificados e assimétricos.
No presente Alerta Legal, pela especial relevância que assumem, iremos centrar-nos nas principais alterações ao Regime Jurídico da Urbanização e Edificação (“RJUE”), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 555/99, de 16 de dezembro, estando em preparação uma Newsletter de cariz mais alargado e desenvolvido sobre o novo diploma.
Não obstante o Decreto-Lei n.º 10/2024, de 8 de janeiro, entrar em vigor a 4 de março de 2024, há normas desde já aplicáveis. Neste sentido, começamos por salientar as principais novidades introduzidas no RJUE, as quais entraram em vigor no dia 1 de janeiro de 2024:
1. Remoção da autorização de utilização como forma de controlo prévio
Com este diploma, é eliminada a autorização de utilização quando tenha existido obra sujeita a um controlo prévio, substituindo-se essa autorização pela mera entrega de documentos, incluindo os termos de responsabilidade dos técnicos, sem possibilidade de indeferimento por parte do município.
Por seu turno, quando exista uma mera alteração de uso (sem obra sujeita a controlo prévio), deve ser apresentada uma comunicação prévia com um prazo de 20 dias para o município responder, considerando-se aceite o pedido de autorização de utilização, caso o município não responda.
Mantêm-se, naturalmente, em ambos os casos os poderes de fiscalização do município
2. Dispensa de apresentação de Ficha Técnica de Habitação (“FTH”), licença de utilização ou certidão de dispensa da autorização de utilização em caso de compra e venda de imóveis
No âmbito das transações imobiliárias, simplificam-se as formalidades relacionadas com a compra e venda de imóveis, eliminando aquelas formalidades que não representam valor acrescentado.
Com esta medida, são, assim, eliminadas, no momento da celebração do contrato de compra e venda do imóvel, a exibição ou prova de existência da FTH e da autorização de utilização ou de demonstração da sua inexigibilidade
3. Alargamento de novas situações de isenção de controlo prévio
Alargou-se o âmbito de situações isentas de controlo prévio, das quais destacamos, para além de isenções relacionadas com obras coercivas ou demolição de obras ilegais e obras de iniciativa da Administração Pública, as seguintes:
✓ Operações urbanísticas que impliquem o aumento de número de pisos, sem aumento da cércea ou fachada;
✓ Obras interiores que afetem a estrutura de estabilidade, mediante apresentação de termo de responsabilidade emitido por técnico habilitado a atestar que a estrutura de estabilidade é de considerar aceitável face à situação em que o imóvel se encontrava antes da obra realizada;
✓ Nos casos de obtenção de informação prévia suficientemente precisa para a operação urbanística;
✓ Substituição de vãos por outros que, conferindo acabamento exterior idêntico ao original, promovam a eficiência energética.
1. Novos casos de comunicação prévia em substituição do licenciamento
Como novos casos de comunicação prévia (com consequente dispensa de obtenção de uma licença urbanística), determina este diploma que a licença de loteamento é substituída por uma comunicação prévia quando exista plano de pormenor ou unidade de execução com determinadas características fixadas na lei.
2. Impossibilidade de escolha do licenciamento quando é admissível seguir o procedimento de comunicação prévia
Combatendo uma certa tendência dos investidores para optar, por um conjunto variado de circunstâncias, pelo licenciamento, os particulares deixam de ter a possibilidade de escolher seguir o regime da licença quando é legalmente possível seguir o procedimento simplificado da comunicação prévia.
3. Aprovação do regime do deferimento tácito para as licenças de construção
Adoção da lógica do deferimento tácito para as situações em que as decisões necessárias não tenham sido tomadas nos prazos legalmente devidos. As câmaras terão mais tempo para decidir, mas, não o fazendo atempadamente, os promotores poderão avançar com os seus respetivos projetos.
Ainda no âmbito desta medida, entrou em vigor no passado dia 1 de janeiro de 2024, o novo artigo 28.º-B do Decreto-Lei n.º 135/99, de 22 de abril, norma que permite, precisamente, a obtenção de certificação de deferimentos tácitos e de comunicações prévias com prazo sem pronúncia da entidade competente.
Operacionaliza esta norma a passagem de certidão que ateste a ocorrência de qualquer deferimento tácito ou outro tipo de efeitos positivos associados à ausência de resposta das entidades competentes, à luz do Código do Procedimento Administrativo ou de qualquer 3 outra lei ou regulamento, independentemente da natureza da entidade competente para a prática do ato.
4. Alteração da regra de contagem dos prazos administrativos
Desde 1 de janeiro de 2024 que está em vigor a norma que permite a obtenção de certificação de deferimentos tácitos e de comunicações prévias.
Relacionado com a medida anterior, e tal como já previsto no Código do Procedimento Administrativo (“CPA”), o presente pacote de medidas Simplex estabelece que:
✓ A contagem dos prazos passa a iniciar-se com a entrega do pedido pelo particular e não num qualquer momento intermédio no procedimento, reforçando-se a certeza e a segurança;
✓ Os prazos só se suspendem se o particular demorar mais de 10 dias a responder a pedidos de informação, documentos adicionais ou a outras solicitações da Administração Pública; e
✓ Apenas é possível pedir por uma única vez informações, documentos adicionais ou formular outras solicitações durante o procedimento.
5. Eliminação do alvará de licença de construção
Prevê-se que o alvará de licença de construção seja substituído pelo recibo de pagamento das taxas devidas à medida que os projetos de investimento são desenvolvidos pelos respetivos interessados.
6. Proibição do indeferimento do pedido de licenciamento ou comunicação por falta de instrução inicial do procedimento
Imposição da proibição legal de indeferimento do pedido de licenciamento ou de comunicação prévia com fundamento na incompleta instrução do mesmo, quando o município não haja proferido, anteriormente, despacho de rejeição liminar ou convite para corrigir ou completar o pedido.
7. Eliminação da solicitação de emissão de pareceres pelas entidades competentes
Elimina-se a necessidade de parecer da entidade competente em matéria de património cultural em várias situações. Assim, quanto a imóveis localizados em zonas de proteção de bens imóveis em vias de classificação ou de bens imóveis classificados de interesse nacional ou de interesse público, não há lugar a parecer da entidade competente em matéria de património cultural quando:
8. Alargamento do período de validade dos pedidos de informação prévia favoráveis
Extensão do prazo de validade dos pedidos de informação prévia favoráveis de um para dois anos.
9. Proibição dos municípios exigirem documentação instrutória adicional
Impede-se que os municípios possam exigir documentação a nível da instrução adicionais face aos previstos na lei e em portaria especificamente destinada à identificação desses documentos. Neste sentido, para efeitos de clarificação, é adotada uma lista não exaustiva de documentos que não podem ser exigidos, nem pela referida portaria, nem pelos regulamentos ou pela prática dos municípios.
10. Clarificação dos poderes de cognição dos municípios
São clarificados os poderes de cognição dos municípios no exercício do controlo prévio urbanístico, em especial relativamente à emissão de licenças.
Neste campo o diploma esclarece que não compete ao município apreciar questões relativas ao interior dos edifícios ou matéria relativa às especialidades (como seja, águas, eletricidade, gás). Para clarificação, é elaborada uma lista não exaustiva de aspetos que não cabe ao município analisar, uma vez que os mesmos são elaborados com base em declarações de cumprimento das normas legais aplicáveis por técnicos competentes.
Note-se que a limitação dos poderes dos municípios no momento do controlo prévio ou emissão de licença não prejudica os seus poderes de fiscalização.
11. Criação da Plataforma Eletrónica dos Procedimentos Urbanísticos
Esta novidade digital será de utilização obrigatória a partir de 5 de janeiro de 2026 e procura, de forma mais elucidativa, modernizar e automatizar o procedimento e a tramitação das formas de controlo prévio. Com esta plataforma os promotores poderão:
Para aceder à versão integral do Decreto-Lei n.º 10/2024, de 8 de janeiro, por favor clique aqui.