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Passivos atuariais: impactos contábeis em benefícios pós-emprego

Por Juliana Abes e Rafael Matsunaga, gerentes sênior de Audit & Assurance da Deloitte; e Rafaella Silva, gerente de Audit & Assurance da Deloitte

O CPC 33 (R1) tem como objetivo estabelecer diretrizes da contabilização dos benefícios ofertados pelas organizações a seus empregados. Os que se aplicam a essa norma são:

  • Planos ou acordos formais entre a organização e seus empregados, seja de forma individual, categoria de profissionais ou seus representantes;
  • Disposições legais ou acordos coletivos;
  • Práticas informais que deem origem a uma obrigação construtiva da organização.

Os benefícios são segregados entre benefícios de curto prazo, pós-emprego, longo prazo e rescisórios. 

Dentro dessas segregações, o CPC 33 (R1) sugere a contratação de um atuário independente para realizar os cálculos das obrigações para os benefícios caracterizados em pós-emprego e longo prazo, com a necessidade de estimar a probabilidade do evento gerador ocorrer, ou do esgotamento do benefício em eventos já ocorridos. Esses benefícios são: plano de aposentadoria, seguro de vida, plano de assistência médica, multa do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), jubileu ou outros por tempo de serviço e por invalidez de longo prazo.

Cenário atual

Ao longo dos últimos três anos, as empresas que contabilizam passivos atuariais decorrentes de benefícios pós-emprego (CPC 33 - R1 ou ASC 715) em suas demonstrações financeiras têm sido impactadas com a volatilidade do cenário econômico brasileiro. Dentre os diversos fatores que podem ocasionar essas oscilações, quatro elementos se destacaram nos últimos exercícios:

  • Taxas reais de juros;
  • Inflação;
  • Pandemia da Covid-19;
  • Alteração do quadro de funcionários ou dos benefícios ofertados.

Taxa real de juros e inflação econômica

Conforme a taxa básica de juros e a inflação econômica têm atingido patamares mais elevados, os títulos públicos utilizados como benchmark para apuração dessa premissa têm seguido a mesma direção.

De acordo com as condições de mercado em 30 de novembro de 2022, observa-se um aumento de, aproximadamente, 0.71 p.p. com relação às taxas de juros apuradas no encerramento do exercício de 2021. Caso essas taxas se mantenham nesse patamar até dezembro de 2022, as Companhias observarão reduções entre 8% e 15% nos passivos atuariais.

Apesar do viés de alta, o comportamento das taxas pode sofrer maiores oscilações em decorrência de outros fatores externos e exógenos, que não são previsíveis.

Na contramão dos ganhos atuariais ocasionados pelo aumento da taxa de juros, as organizações que oferecem planos de benefícios previdenciários, principalmente aqueles que preveem a possibilidade de recebimento de pagamentos sob a forma de renda mensal vitalícia, poderão registrar perdas no passivo atuarial devido aos altos índices de inflação observados em 2022. 

Esses índices, utilizados em planos previdenciários para reajuste dos benefícios, têm evoluído acima da hipótese de inflação de longo prazo adotada nas avaliações atuariais para fins contábeis. Esse desencontro ocasionará perdas a serem registradas na experiência do plano.

Por fim, organizações que contabilizam passivos atuarias de planos de assistência médica também poderão observar perdas no encerramento de 2022. 

Pandemia da Covid-19

Com a pandemia decorrente da Covid-19, muitos procedimentos médicos eletivos ficaram represados ao longo dos dois últimos anos. De acordo com dados levantados pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), a pandemia provocou uma queda de cerca de 27 milhões de procedimentos médicos, quando comparado o volume de atendimentos médicos registrados no SIA-SUS (Sistema de Informações Ambulatoriais do Sistema Único de Saúde) entre março (primeiro mês da pandemia no Brasil) e dezembro de 2020 com o mesmo período do ano anterior. 

A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) havia definido que os planos de saúde individuais ou familiares teriam reajuste negativo de maio de 2021 a abril de 2022. O índice estabelecido foi de -8,19%, e resultou na queda das despesas assistenciais ocorrida no setor em 2020 devido a pandemia. Por conta desses fatores, muitas organizações observaram ganhos atuariais relativos aos custos médicos, que evoluíram abaixo da expectativa.

Com o avanço da vacinação e a recuperação do sentimento de segurança da população, a busca pelos procedimentos médicos foi retomada. Segundo a Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), os indicadores que explicam o aumento são o reajuste de 15,5% nos planos individuais desde maio, conforme divulgado pela ANS; e a expectativa de reajuste para os planos coletivos entre 16% e 19%. Como a maioria das organizações têm adotado índices nominais de crescimento entre 9% e 11%, devem registrar um aumento acima do esperado no passivo atuarial.

É importante que a definição das premissas de custos médicos, inflação médica e fator de envelhecimento seja realizada de forma concisa e realista em relação ao plano, observando as necessidades de longo prazo e as expectativas. É preciso buscar por situações atuais e exógenas, refletindo a realidade dos benefícios nos resultados das avaliações atuariais e mitigando possíveis oscilações não esperadas.

Alteração do quadro de funcionários ou dos benefícios 

Além dos pontos citados acima, a oscilação econômica, no Brasil e em diversos países do mundo, gerou a necessidade de as organizações realizarem demissões em massa ou alterarem a oferta de seus benefícios aos funcionários, a fim de reduzir custos e manter a saúde dos negócios. 

Há, também, movimentos em decorrência de compras e vendas de empresas. Para todos esses eventos, do ponto de vista atuarial e das avaliações de benefício pós-emprego sob a ótica do CPC 33 (R1), é necessário o acompanhamento das organizações e o conhecimento de como tais eventos podem impactar o resultado das avaliações atuariais. 

Conforme o parágrafo 99 do CPC 33 (R1), em caso de alteração significativa de benefícios ou de população (demissões, transferências, admissões etc.), é necessário uma avaliação atuarial na data do evento, com as premissas de impacto no tempo. Diferentemente dos ganhos e perdas atuariais que transitam por Outros Resultados Abrangentes, tais efeitos devem ser contabilizados contra o Resultado da companhia. Por esse motivo, é importante reforçar as necessidades e os movimentos contábeis, para que os números reflitam esses eventos. 

Nas últimas divulgações contábeis das organizações, em que seus reguladores já aprovaram o CPC 33 (R1), identificou-se uma inconsistência na norma com relação aos benefícios por invalidez de longo prazo. Atualmente, as organizações que mantêm seus empregados inválidos e seu grupo familiar no plano de assistência médica têm efetuado esses registros contábeis como benefícios pós-emprego,  em vez de benefícios por invalidez de longo prazo. Entretanto, essa classificação deve ser mantida como benefício de longo prazo, caso não haja a perda de vínculo empregatício.

Diferença entre as classificações:

  • Para benefícios de invalidez de longo prazo, caracterizados pela entrada na invalidez, a estimativa de obrigação atuarial ocorre apenas para empregados já inválidos e seu grupo familiar, se houver direito, conforme o parágrafo 157 do CPC 33 (R1); já para os planos de assistência médica pós-emprego – aqueles que são extensíveis após o desligamento –, a obrigação atuarial deve ser estimada para empregados (ativos e inativos) que possuem o direito.
  • Para benefícios de invalidez de longo prazo, as mudanças de cálculos em decorrência de alteração de premissas atuariais e experiência da população exposta são reconhecidas no resultado do exercício, enquanto para planos de benefício pós-emprego são reconhecidas em Outros Resultados Abrangentes.

Além das diferenças contábeis apresentadas acima, é importante uma avaliação das características e abrangência das apólices de planos de assistência médica, realizada por meio do “Questionário de Benefício Pós-Emprego”, desenvolvido pelo Instituto Brasileiro de Atuária – IBA.

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