Leia, a seguir, um artigo que contextualiza o tema e o surgimento da nova legislação. E acesse os conteúdos da série de webinares “Novo marco regulatório do saneamento”, que destaca a visão de agentes do setor público, agências reguladoras, investidores, especialistas em aspectos legais e representantes do mercado de resíduos sólidos.
O chamado “Novo Marco Regulatório do Saneamento” (Lei Federal 14.026, de 15 de julho de 2020) altera as regras para a prestação de serviços no setor, promovendo a ampliação da participação de empresas do setor privado neste mercado, com o objetivo último de universalizar o acesso ao saneamento para todos os lares brasileiros.
O saneamento básico contempla uma série de serviços públicos, infraestruturas e instalações operacionais, envolvendo: (i) abastecimento de água potável; (ii) esgotamento sanitário; (iii) limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos (iv), drenagem e gestão de águas pluviais urbanas.
Há uma grande deficiência dos serviços de saneamento no Brasil. De acordo com o Sistema Nacional de Informação sobre Saneamento (SNIS), apenas 53,2% dos brasileiros tiveram acesso ao serviço de coleta e tratamento de esgoto em 2018. Este é apenas um exemplo de que o setor necessita de fortes investimentos para a promoção da universalização dos serviços de saneamento.
O Ministério da Economia estima que sejam necessários R$ 700 bilhões de investimento até 2033 no setor de saneamento (R$ 500 bilhões para a expansão da rede e R$ 200 bilhões na compensação da depreciação de ativos), ou seja, aproximadamente um investimento de R$ 50 bilhões por ano. Um dos objetivos do Novo Marco Legal é atingir a meta de 99% da população brasileira com acesso a água potável e 90% da população com acesso aos serviços de coleta e tratamento de esgoto até 2033.
Todos os novos contratos de serviços de saneamento deverão incorporar as mudanças promovidas pelo Novo Marco Legal, incluindo os objetivos de universalização.
A regulação e fiscalização do setor será definida pela nova Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), que terá uma tarefa desafiadora de centralização e uniformização da regulação do setor de saneamento, principalmente no que tange às tarifas a serem cobradas dos consumidores de serviços. Atualmente, existem aproximadamente 60 agências reguladoras municipais, intermunicipais e estaduais de saneamento, porém, apenas 52,2% dos municípios estão amparados por estas agências reguladoras.
O Novo Marco torna obrigatório que os Estados e municípios promovam a abertura de um processo licitatório para qualquer contratação de serviço de saneamento, abrindo caminho para a ampliação da participação da iniciativa privada no mercado. Esta alteração da nova legislação veda a celebração de novos contratos de programa, nos quais as empresas estatais podiam prestar serviços de saneamento sem qualquer licitação, ou seja, sem concorrência privada. Porém, isto não significa que haverá privatização dos serviços, uma vez que as atuais empresas públicas de saneamento podem concorrer com a iniciativa privada e serem vencedoras do processo licitatório.
De qualquer forma, estima-se que haverá um aumento da participação de empresas privadas no mercado. Atualmente, cerca de 5% do total de municípios brasileiros são atendidos por empresas privadas. Porém, precisaremos aguardar as primeiras reações do setor privado e o cenário dos possíveis novos investimentos. A princípio, investidores internacionais estão analisando o mercado nacional. Empresas da Espanha, França, China e Canadá já demonstraram interesse no mercado brasileiro de saneamento.
A nova legislação também permite a celebração de contratos dos serviços em bloco, agrupando cidades, de modo que municípios vizinhos poderão integrar o mesmo processo licitatório. Esta separação em blocos será feita pelos Estados, mas os municípios terão um prazo para adesão a essas modalidades. A aglutinação e regionalização torna os blocos de municípios mais atrativos para os investimentos privados.
Por fim, o Novo Marco Legal propicia um ambiente de negócios convidativo aos investimentos privados, possibilitando a viabilidade de grandes investimentos no setor diante de um cenário de restrições fiscais, mas também pressiona as empresas estatais na promoção de iniciativas que busquem maior eficiência.
Elias de Souza
Sócio-líder de Government e Public Services da Deloitte