Para alcançar o net zero até 2050, as organizações precisam entender que o meio ambiente é estritamente ligado à sociedade e aos negócios, incluindo as mudanças climáticas – que pedem ações urgentes.
Por Rafael Gulla
Pensando em sustentabilidade, o termo capital natural se refere a questões ambientais, entre elas ecossistemas, biodiversidade e recursos naturais (água, ar, solo) que fornecem bens e serviços valiosos para a sociedade. Em 2020, o Fórum Econômico Mundial estimou que as atividades econômicas de mais da metade do PIB global – US$ 44 trilhões – são potencialmente uma ameaça ao meio ambiente.
Assim como as empresas possuem um papel importante na preservação e/ou minimização dos danos causados nos capitais naturais em todo seu processo operacional, o estilo de vida da sociedade é também um fator de extrema relevância nesse contexto. O aumento desenfreado do consumo pode impactar negativamente a conservação dos recursos naturais. Por isso, tanto as empresas quanto a sociedade devem se atentar a pequenas ações que visam evitar o desperdício, principalmente com práticas de reuso e reciclagem de resíduos.
No Brasil, a Amazônia Legal – que corresponde a aproximadamente 5 milhões de km² ou cerca de 58,9% do território brasileiro, representando também 67% das florestas tropicais no mundo – é considerada como um importante capital natural. Esse fato posiciona o País no segundo lugar quando se trata da maior porcentagem de área coberta com vegetação nativa no mundo.
Entretanto, existem muitos pontos que precisam de atenção, como apontam os dados do Sistema de Alerta de Desmatamento (Imazon). As áreas de aproximadamente 6.000 km² e 8.000 km² foram, respectivamente, desmatadas e degradadas no período de agosto 2020 a abril 2021. Ainda, dados da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) mostram que 37.400 espécies estão ameaças de extinção, correspondendo a 28% de todas as espécies avaliadas.
Além da extinção de espécies, a destruição de ecossistemas também contribui para a perda de recursos essenciais para a saúde humana. Ou seja, uma vez que muitos medicamentos são derivados de produtos naturais, a devastação deles ocasiona a escassez e até extinção de matérias-primas.
Da mesma maneira, o aparecimento de doenças infecciosas também está ligado ao desmatamento. De acordo com artigo da National Geographic publicado em 2020, há cada vez mais evidências científicas que indicam que o desmatamento cria condições para o surgimento e dispersão de patógenos como bactérias, fungos e vírus entre os seres humanos que, em alguns casos, podem ser letais.
Ainda, a crise hídrica, que vem afetando o Brasil há algum tempo, também é potencializada pela exposição do solo na retirada de cobertura vegetal, resultando na seca de nascentes e águas subterrâneas e na redução do fluxo de rios, além de contribuir com o assoreamento dos corpos d’água devido à ausência de cobertura vegetal em suas margens.
O Aqueduct Water Risk Atlas é uma iniciativa que identifica e mapeia os riscos hídricos, como inundações, secas e esgotamento. Segundo dados do instituto, no Brasil as regiões dos estados da Bahia, Piauí, Ceará e Rio Grande do Norte sofrem risco de níveis extremamente altos de escassez de água. Algumas regiões metropolitanas de São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Campinas, Ribeirão Preto e Vitória também apresentam risco alto.
Se continuarmos utilizando vertiginosamente o capital natural, sem permitir que ele consiga se recuperar, há o risco de uma crise em todo o ecossistema. As ações que preservam a natureza são essenciais, pois têm o objetivo de proteger, reforçar práticas sustentáveis e restaurar recursos naturais.
A preservação dos ecossistemas ajuda na estabilidade climática, a reciclagem de nutrientes e produção de biomassa são exemplos de ações recomendadas para manter a continuidade dos recursos naturais, sejam elas extraídas por meio de alimento, combustível ou qualquer outra matéria orgânica. Além dessas práticas, a redução de carbono é uma das mais importantes ações quando falamos do combate às mudanças climáticas. O investimento em saneamento básico adequado também é um ponto importante não somente para a área da saúde de prevenção de doenças, mas como uma forma de conduta positiva para toda a sociedade.
A melhoria e a preservação do capital natural não são apenas responsabilidades do setor público ou das iniciativas privadas. A sociedade de forma geral também precisa entender a sua relação com o meio ambiente e como é possível preservar o capital natural existente. O descarte incorreto do lixo gerado, assim como o consumo excessivo de água são exemplos da contribuição negativa da sociedade em relação ao cuidado com a natureza.
É essencial que as empresas se posicionem frente a esse cenário, para que consigam enfrentar os principais impactos da dependência do capital natural. Com essas questões mapeadas, é necessário que as organizações mensurem os possíveis riscos e oportunidades que a preservação do capital natural traz.
Os compromissos apresentados na Agenda 2030 e nos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU preveem resoluções concretas em relação às mudanças climáticas. Este é um tema urgente e precisa ser priorizado pelo setor público e iniciativa privada.
Rafael Gulla é gerente da prática de Sustentabilidade/ESG na Deloitte