Ir para o conteúdo principal

Green corruption: uma ameaça ao meio ambiente

Combater a corrupção verde é uma questão crítica para a sustentabilidade ambiental

Segundo a Interpol, entre 2006 e 2016, crimes ambientais cresceram entre 5% e 7% ao ano, uma taxa de crescimento duas a três vezes maior que o PIB global1, tornando-se a terceira atividade mais lucrativa para o crime organizado transnacional e gerando até US$ 280 bilhões anualmente2. Esses crimes são atrativos para os criminosos pois apresentam atividades de risco relativamente baixo com alta recompensa, em grande parte devido à limitação dos esforços de fiscalização ambiental. A demanda por produtos de vida selvagem traficada permanece alta e as penalidades criminais não são tão severas quanto para outras atividades ilícitas3. Assim, o combate à corrupção verde tem se tornado uma questão crítica para a sustentabilidade ambiental.

Cunhado pelo Basel Intitute on Governance, o termo "Green Corruption" (corrupção verde), refere-se à corrupção e crimes financeiros que causam danos ao meio ambiente e à biodiversidade4. Esse tipo de corrupção está associado a atividades ilícitas relacionadas a recursos naturais, como tráfico de vida selvagem, exploração ilegal de madeira, pesca predatória, mineração e comércio de resíduos, todos impactando ecossistemas e comunidades locais.

Embora essa prática afete países de todas as regiões, seu impacto é particularmente grave em nações mais pobres, onde a regulamentação é mais fraca e a fiscalização limitada. Esses crimes frequentemente envolvem suborno, lavagem de dinheiro e outros delitos financeiros que facilitam atividades ilegais em larga escala. Além disso, causa danos significativos aos ecossistemas locais justamente em um momento em que o mundo está intensificando os esforços para combater as mudanças climáticas e as ameaças à biodiversidade5.

Dada a abrangência desses crimes, o combate à corrupção verde demanda uma abordagem multissetorial e coordenada, abrangendo desde o fortalecimento de agências de aplicação da lei até a colaboração com empresas e comunidades locais. Nesse contexto, as empresas de todos os setores têm um papel essencial, que vai além de suas práticas internas, estendendo-se a suas cadeias de fornecedores e parceiros comerciais. A integridade na cadeia de valor é fundamental para garantir que os recursos naturais utilizados não estejam ligados a atividades ilícitas, como exploração ilegal de madeira e pesca predatória6. Ao incorporar práticas de due diligence ambiental, monitoramento e transparência ao longo da cadeia de valor, as empresas podem evitar a entrada de produtos ou materiais obtidos de forma ilegal, reduzindo assim o impacto da corrupção verde nos ecossistemas e promovendo uma economia mais sustentável.

Estima-se que trilhões de dólares em fluxos ilícitos estejam envolvidos anualmente nessas atividades. O Banco Mundial, por exemplo, estima que as perdas econômicas anuais resultantes de atividades ilícitas relacionadas a crimes ambientais alcancem entre US$ 1 a 2 trilhões7. Assim, além de ser um imperativo moral, enfrentar esses crimes é uma necessidade econômica.

Discussão do tema pela primeira vez no B20 Brasil
 

A pauta da corrupção verde foi tratada como prioridade pela primeira vez no B20, sediado e presidido pelo Brasil em 2024, impulsionada pela força-tarefa de Integridade e Compliance, que destacou sua importância tanto para o País quanto para a comunidade internacional8. Como um dos países com maior biodiversidade do mundo e com 60,1% da Amazôniadentro de suas fronteiras, o Brasil possui uma responsabilidade única na proteção de seus recursos naturais. No entanto, práticas corruptas como a exploração ilegal de madeira e mineração ilegal têm levado a perdas irreparáveis nos biomas brasileiros.

Como dispõe o Instituto Igarapé, o desmatamento é apenas a parte visível do crime ambiental. A extração de madeira ilegal é alimentada por redes criminosas transnacionais que utilizam licenças fraudulentas, empresas de fachada em paraísos fiscais e documentos falsificados para integrar recursos ilícitos ao sistema financeiro global. No Brasil, a Amazônia representou 61% do desmatamento nacional no ano de 2020, o que demonstra que o combate a esses crimes não só é uma questão ambiental, mas também de reputação e segurança econômica para o País10. A falta de rastreamento eficaz e a corrupção facilitam esse ciclo, tornando urgente uma ação coordenada para preservar a biodiversidade e garantir um futuro sustentável.

Assim, dado o cenário atual, a força-tarefa de Integridade e Compliance destacou que as práticas corruptas que promovem desvios como o desmatamento ilegal e a exploração predatória são desafios que precisam ser abordados tanto em nível nacional quanto internacional, com a colaboração de governos, empresas e sociedade civil.

O que o B20 demandou ao G20

Durante o B20 Brasil, a força-tarefa de Integridade e Compliance propôs ao G20 ações claras para combater a corrupção ambiental. As recomendações incluem: a convergência de frameworks de sustentabilidade para melhorar a interoperabilidade e garantir transparência nas divulgações, com uma atenção especial às pequenas e médias empresas (MSMEs); a promoção da Ação Coletiva, incentivando a colaboração entre os setores público, privado e sociedade civil para fortalecer a integridade nas cadeias de valor; além da proposta de transparência e accountability a fim de combater a corrupção relacionada à transição verde, crimes ambientais e violações de direitos humanos. Essas propostas visam fortalecer a transparência e a governança, incentivando que o G20 adote diretrizes para que as empresas e os governos se comprometam em combater práticas ambientais ilegais e sustentem os compromissos de desenvolvimento sustentável.

O Policy Paper completo pode ser lido aqui.

Desdobramentos no G20: compromisso ministerial com o combate a crimes ambientais

O combate à corrupção associada a crimes ambientais ganhou espaço na agenda internacional com a reafirmação de compromissos importantes pelo G20. Na Declaração Ministerial Anticorrupção11, os países membros destacaram a relevância da Resolução 8/12 da Conferência dos Estados Partes da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, que trata da "Prevenção e combate à corrupção relativas a crimes que impactam o meio ambiente".

Nesse contexto, o G20 reconheceu a gravidade dos impactos desses crimes e reforçou seu compromisso em fortalecer estruturas anticorrupção, promovendo práticas éticas, integridade e transparência. A declaração também sublinha a importância de prevenir conflitos de interesse que possam facilitar atividades ilícitas relacionadas ao meio ambiente, alinhando os esforços internacionais para proteger ecossistemas e combater redes criminosas transnacionais.

Ao reafirmar esses compromissos, os países-membros demonstram que a corrupção verde não é apenas uma ameaça ao meio ambiente, mas também um desafio significativo para a estabilidade econômica, a justiça social e os esforços globais contra as mudanças climáticas. Essa posição do G20 destaca a necessidade de coordenação entre governos, empresas e organizações da sociedade civil, promovendo uma abordagem coletiva para fortalecer a governança global e implementar soluções sustentáveis e inclusivas.

Call to action: O que as empresas podem fazer no combate à green corruption?

Embora as recomendações do B20 ao G20 sejam direcionadas aos governos, a comunidade empresarial também tem um papel essencial no combate à corrupção verde. Algumas ações práticas que podem ser adotadas incluem:

  • Implementar due diligence ambiental: empresas podem adotar processos rigorosos de due diligence que identifiquem e monitorem riscos de corrupção ambiental em suas cadeias de fornecedores.
  • Promover transparência e divulgação: adoção de padrões transparentes de divulgação ambiental e relatórios frequentes sobre impacto ambiental e conformidade com regulações ambientais, incluindo os padrões sugeridos pelo B20.
  • Investir em programas de treinamento e conscientização: capacitar funcionários e fornecedores sobre os riscos e as consequências da green corruption pode ajudar a criar uma cultura de integridade dentro da organização e na cadeia produtiva.

O combate à corrupção verde é um tema de alta relevância e urgência, pois as consequências da exploração ambiental ilegal vão além dos danos ao ecossistema: elas ameaçam a estabilidade econômica, agravam a desigualdade social e intensificam a crise climática global. A adoção das recomendações do B20 pelo G20, mas também pela própria comunidade empresarial, representa uma oportunidade essencial para estabelecer padrões globais que incentivem práticas de negócios responsáveis e garantam a proteção dos recursos naturais para as futuras gerações. A colaboração entre empresas, governos e a sociedade civil é crucial para interromper as redes criminosas envolvidas em crimes ambientais e promover um desenvolvimento sustentável.

Fontes:
 

1 UNEP, INTERPOL. The rise of environmental crime. A growing threat to natural resources, peace, development, and security. Disponível em: https://wedocs.unep.org/bitstream/handle/20.500.11822/7662/-The_rise_of_environmental_crime_A_growing_threat_to_natural_resources_peace%2C_development_and_security-2016environmental_crimes.pdf.pdf?sequence=3&isAllowed=y

2 Interpol, Organized crime groups pushing environmental security to tipping point. https://www.interpol.int/News-and-Events/News/2023/Organized-crime-groups-pushing-environmental-security-to-tipping-point

3 Wilson Center, Combating Green Corruption: Fighting Financial Crime as a Driver of Environmental Degradation. Disponível em: https://www.wilsoncenter.org/event/combating-green-corruption-fighting-financial-crime-driver-environmental-degradation

4 Swissinfo.ch, Green Corruption - a planetary crime fought from Basel. Disponível em: https://www.swissinfo.ch/eng/business/green-corruption-a-planetary-crime-fought-from-basel/48189556

5 Wilson Center, Combating Green Corruption: Fighting Financial Crime as a Driver of Environmental Degradation. Disponível em: https://www.wilsoncenter.org/event/combating-green-corruption-fighting-financial-crime-driver-environmental-degradation

6 WWF, Targeting Natural Resource Corruption. Disponível em: https://www.worldwildlife.org/pages/tnrc-targeting-natural-resource-corruption

7 World Bank, “The real costs of illegal logging, fishing and wildlife trade: $1 trillion - $2 trillion per year”. https://blogs.worldbank.org/en/voices/real-costs-illegal-logging-fishing-and-wildlife-trade-1-trillion-2-trillion-year

8 B20 Brasil 2024, Policy Paper: Integridade e Compliance. Disponível em: https://b20brasil.org/documents/85520/419852/B20+Policy+Paper_Integridade.pdf/8ca171a5-f795-4366-2431-15b8f05123e8?version=1.0&t=1729603099548&download=true

9 WWF, Por dentro da Floresta Amazônica. Disponível em: https://www.wwf.org.br/natureza_brasileira/areas_prioritarias/amazonia1/bioma_amazonia/#:~:text=O%20bioma%20Amaz%C3%B4nia%20%C3%A9%20quase,%25%20%E2%80%93%20est%C3%A1%20em%20territ%C3%B3rio%20brasileiro

10 Instituto Igarapé, Siga o Dinheiro: Conectando sistemas de proteção contra a lavagem de dinheiro para combater a prática de crime ambiental na Amazônia. Disponível em: https://igarape.org.br/siga-o-dinheiro/

11 G20 Brasil 2024, Declaração Ministerial Anticorrupção. Disponível em: https://g20.gov.br/pt-br/trilhas/trilha-de-sherpas/anticorrupcao/declaracao-ministerial-anticorrupcao-do-g20.pdf/@@download/file

Did you find this useful?

Thanks for your feedback