A indústria de seguros, no cenário global, passa por um momento turbulento devido as novas regulamentações, resultando tanto em novos desafios, quanto em oportunidades de crescimento para as empresas do setor.
Entre as principais normas que estão moldando o futuro dessa indústria estão a IFRS 17 (International Financial Reporting Standards) e o requerimento regulamentar sobre a Autoavaliação de Risco e Solvência (ORSA, na sigla em inglês) – é preciso se atentar aos novos riscos que afetam o setor e estão atrelados a essas mudanças regulatórias.
A norma IFRS 17 vem para substituir a IFRS 4 e determinar novos padrões internacionais que alinham as práticas de contabilidade e tornam as demonstrações financeiras comparáveis dentro e fora do Brasil. Isso acontece a partir de uma série de transformações contábeis, atuariais e tecnológicas que mudam a forma como os contratos de seguro são mensurados e apresentados, além da maneira como a seguradora faz a gestão de desempenho e controla seus portfólios.
Depois de alguns adiamentos após determinação do IASB (International Accounting Standards Board), a adoção da norma foi feita em 2023, permitindo que as companhias tivessem tempo para se adequar. Os reflexos foram sentidos especialmente pelas organizações multinacionais, pois a implementação da IFRS 17 ainda não é obrigatória para o mercado brasileiro.
No entanto, mais cedo ou mais tarde, as empresas nacionais também terão de se ajustar à regulamentação. Muitas, inclusive, já estão se movimentando para isso, graças a divulgação feita pela Superintendência de Seguros Privados (Susep) sobre um plano de regulação que traz comparações com a IFRS 17, a fim de identificar e ajustar lacunas. Nesse sentido, há a expectativa de que o órgão se posicione em breve sobre a adoção de norma internacional para o mercado local.
Tal conjuntura reforça não apenas a urgência das empresas acelerarem seus planos de adaptação à norma, mas também leva as companhias que já a implementaram para uma segunda fase, chamada de “Dia 2”. Nela, a empresa tem a possibilidade de implementar ou automatizar processos para diminuir o tempo de: (1) fechamento contábil e (2) trabalhos manuais, que ainda são sendo executados desde a implementação inicial do complexo normativo internacional.
Nessa segunda fase, as organizações podem olhar com calma para o seu percurso, refinar o processo e estabelecer mais controle nos cálculos contábeis, trazendo mais robustez ao trabalho feito anteriormente. Nesse momento também é possível educar os stakeholders sobre as implicações da nova norma para adaptar os indicadores chave. Além de ser uma oportunidade para melhorar todo o processo, repensar produtos, aprimorar áreas autorais, investir em tecnologia, revisar metodologias e recalibrar premissas para garantir um futuro promissor no setor de seguros. Algumas empresas procuram desenvolver novos relatórios gerenciais capazes de trazer informações úteis, que serão utilizadas na gestão das carteiras, e riscos associados aos contratos no escopo da norma.
ORSA é um processo interno do setor de seguros que contempla uma avaliação contínua para identificar se a empresa possui capital suficiente para cumprir com suas obrigações, especialmente com os segurados, mesmo em cenários adversos e de riscos. Essa avaliação inclui um mapeamento dos riscos, a fim de certificar que a empresa está cumprindo estratégias de mitigação de curto e longo prazo.
Assim como muitas oportunidades surgiram e ainda surgem com a adoção da IFRS 17, o mesmo acontece com a implementação da regulamentação sobre a ORSA. Apesar de seus prazos serem mais elásticos, é preciso que ela entre no planejamento da organização, dada a complexidade do processo e a necessidade de envolvimento de vários departamentos. Esse processo permite analisar amplamente o modelo de negócios e autoavaliar os riscos.
Assim, é possível dizer que ORSA e IFRS 17 são normas complementares, visto que enquanto uma pensa em insolvências, a outra avalia resultados. Por isso, devem entrar conjuntamente entre as prioridades dos profissionais do mercado segurador, incluindo C-level, controladores e gerentes das áreas contábil e financeira.
Há ainda situações que relacionam ambas as regulamentações:
Ambas as regulamentações precisam ser implementadas à luz da responsabilidade social das seguradoras em relação a indivíduos e à sociedade como um todo, antecipando necessidades. Há uma pressão regulatória para entender melhor o comportamento de risco e, assim, se precificar melhor.
Entre os principais riscos enfrentados pelas seguradoras atualmente, conforme o levantamento Deloitte Insurance Outlook 2024, estão as ameaças digitais, envolvendo perdas financeiras ou de reputação, os conflitos geopolíticos – como a guerra na Ucrânia –, e a emergência climática, que vem provocando catástrofes cada vez mais severas.
Diante desses riscos e das pressões regulatórias, é cada vez mais importante manter o foco na jornada do cliente, com uma experiência única que cubra questões patrimoniais, de renda e que também ofereça coberturas customizadas para todos os tipos de necessidades, seja para empresas ou indivíduos.
Dessa maneira, fica claro que todas as mudanças normativas e tecnológicas do setor devem se concentrar em aprimorar a função social dessa indústria. É preciso entender que o segurado é mais que um cliente e que é necessário entender as necessidades de sua vida. O mesmo acontece com o atendimento às organizações, em que é preciso entender sua trajetória para desenvolver/oferecer produtos e serviços que, de fato, vão torná-las melhores e mais seguras.
Na esteira das mudanças que visam um futuro de sucesso, o setor de seguros foca cada vez mais na criação de produtos customizados, guiado por dados, pelo comportamento do cliente e por suas necessidades específicas. É uma virada de chave que passa pela transformação do papel dessa indústria, impulsionando decisões e estratégias pautadas por propósitos que criam um mercado mais consciente e, consequentemente, uma sociedade melhor.