Por Felipe Donatti
Embora a comunidade empresarial reconheça e entenda cada vez mais que as emissões atmosféricas de gases de efeito estufa (GEE) de origem humana estão alterando o clima de maneira prejudicial ao planeta e a sociedade, muitas empresas ainda têm dificuldades em avançar além do básico.
O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), afirma que manter os aumentos da temperatura média da superfície em não mais de 1,5°C em relação aos níveis pré-industriais é fundamental para evitar impactos mais devastadores das mudanças climáticas. O IPCC avalia que fazer isso significa cortar as emissões globais de GEE aproximadamente pela metade até 2030 (em comparação com os níveis de 2010) e atingir as emissões líquidas zero – não liberando mais carbono para a atmosfera do que é removido – até 2050. E atingir essa meta de zero líquido quase certamente requer uma transformação completa do sistema econômico global, em todos os setores.
O Relatório de Riscos Globais 2021 do Fórum Econômico Mundial pontuou a “falha da ação climática” – definida como o fracasso dos governos e organizações em fazer cumprir, promulgar ou investir em medidas eficazes de adaptação e mitigação das mudanças climáticas, preservar ecossistemas, proteger as populações e fazer a transição para uma economia neutra em carbono – como o segundo risco global de maior impacto e o segundo risco mais provável de ocorrer no longo prazo, sendo que este risco figura nos Relatórios desde 2013, acompanhado do risco “Eventos climáticos extremos” (este consta, desde 2017, como o risco de maior probabilidade de ocorrência).
Para combater as mudanças climáticas e facilitar a transição para uma economia de baixo carbono, os setores público e privado precisam acelerar a ação política relacionada ao clima, aumentando a transparência dos dados e a divulgação sobre as ações em andamento que visam tornar essa transição possível.
Com o objetivo de identificar como o setor privado tem abordado a crise climática, a Deloitte realizou uma pesquisa em colaboração com a Oxford Economics, entre janeiro e fevereiro de 2021, com 750 executivos de diversos cargos, dos principais setores da indústria.
De forma geral, a pesquisa revelou que os líderes empresariais continuam a ver o mundo em um ponto crítico no que diz respeito à mudança climática. Apesar da pandemia e da correspondente recessão econômica terem desacelerado as ações de sustentabilidade, ainda existe senso de determinação de que, se agirem agora, ainda é possível alterar o curso da mudança climática e evitar os piores cenários no futuro.
Os riscos relacionados às mudanças climáticas são principalmente divididos em físicos e de transição.
Os riscos físicos representam os impactos diretos e indiretos de condições meteorológicas severas na infraestrutura, na segurança dos trabalhadores, na produtividade e nas operações de uma indústria. Já os riscos de transição são resultantes dos desafios de mitigação à medida que sociedade e economia se descarbonizam. Por exemplo, para estimular uma transição de baixo carbono, os governos precisarão tomar medidas que irão naturalmente impactar as empresas.
Os riscos de transição são compostos por riscos reputacionais e riscos de transição política, legal e de mercado.
Net zero tem se tornado uma das expressões mais comentadas nos círculos corporativos. Uma gama cada vez mais crescente de empresas e governos está, de fato, enfrentando as mudanças climáticas, com novos anúncios surgindo diariamente sobre metas de emissões ambiciosas e iniciativas climáticas.
Apesar de existirem diversas iniciativas em andamento para definir padrões claros e específicos para alguns setores sobre metas de emissões líquidas zero, ainda não existem consensos globalmente aceitos. Um estudo recente da Climate Action 100+ (a maior iniciativa de engajamento de investidores em mudanças climáticas, que reúne160 empresas globais com emissões significativas de GEE e/ou são críticas para a transição de emissões líquidas zero), demonstrou que, em geral, os investidores e o público buscam por:
A transição para uma economia de baixo carbono exige a transformação sincronizada de sistemas interdependentes, com uma visão holística. Por exemplo, uma frota de veículos eletrificados somente irá abordar de forma significativa as questões relacionadas às mudanças climáticas se a fonte da energia for limpa e renovável, o veículo e seus componentes tiverem sido fabricados por meio de processos circulares de baixo desperdício, usando matérias-primas extraídas de forma sustentável, respeitando as leis trabalhistas e incorporando os princípios de responsabilidade social.
Dessa forma, além dos compromissos de redução das emissões assumidos, existem quatro fontes fundamentais de valor na economia de baixo carbono:
Apesar do imenso progresso nos últimos anos, é preciso ir além dos compromissos que estão sendo assumidos hoje para alcançar as metas do Acordo de Paris. Para isso, também é fundamental que exista uma convergência internacional de dados, padrões, métricas e divulgação em direção ao “net zero”.
Embora coloque alguns ativos e investimentos existentes em risco, a descarbonização e o “net zero” catalisam investimentos em setores novos e não tradicionais, que podem trazer diversas oportunidades de negócios na transição para uma economia líquida zero. É um tema que precisa estar no planejamento das organizações desde já, para que elas possam manter sua competitividade.
Felipe Donatti é gerente da prática de Sustentabilidade/ESG na Deloitte