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O Beneficiário Efetivo e a Cumplicidade das Entidades Relacionadas: Compreenda os Riscos e Implicações

Artigo TaxLab

Autores: Luís Filipe Bernardo, Senior Manager; Benedita Sousa Otto, Senior Consultant; Mariana Monteiro, Consultant 

 

A temática do beneficiário efetivo, especialmente no contexto dos mecanismos de dupla tributação internacional, está a ganhar cada vez mais destaque. E com razão: enquanto não houver clareza sobre as condições necessárias para esta qualificação, a discussão manterá a sua relevância.

O conceito de "beneficiário efetivo" aparece nas Diretivas Comunitárias Mãe-Filhas e Juros e Royalties, bem como nas diversas Convenções Fiscais para evitar a dupla tributação assinadas por Portugal. Contudo, a interpretação e aplicação deste conceito varia conforme o instrumento legal.

Diretivas Comunitárias e Jurisprudência

O Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), nos famosos "Danish Cases", abordou o conceito de beneficiário efetivo em diferentes contextos normativos.

Na Diretiva Juros e Royalties exige a prova da qualidade de beneficiário efetivo do agente económico que aufere estes rendimentos, na aceção da entidade que beneficia economicamente e tem a liberdade de usar e desfrutar dos juros, como condição de aplicação da dispensa (isenção) de tributação por retenção na fonte, tendo por referência a Convenção Modelo da OCDE e os Comentários à mesma.

Por outro lado, o conceito adquire relevância distinta na Diretiva Mães-Filhas, já numa ótica de aplicação de cláusula anti-abuso, como indício de que uma construção não é “genuína”, em que a existência de uma empresa intermediária sem substância económica, que não pode usar ou desfrutar do rendimento recebido, mas tem a obrigação de o transmitir a um terceiro. Deste modo, não qualifica a empresa intermediária como “beneficiária efetiva” do rendimento, podendo tal facto ser considerado um indício de abuso.

No primeiro caso, a discussão encerra com a falta de preenchimento do conceito. No segundo, inicia a discussão para retirar um benefício que de outra forma se cristalizava. São dois planos distintos de discussão, em que o ónus da prova – que recai no substituto tributário – difere.

Olhemos para o panorama nacional - em caso de falta de substância económica, como ilustra o Processo n.º 776/2022-T do CAAD, os rendimentos deveriam ser sujeitos a tributação por retenção na fonte. Este caso sublinha a importância de estruturas empresariais que possuam substância económica e autonomia na gestão de investimentos.

A jurisprudência canadiana, como os casos Prévost Car Inc. (2008) e Velcro Canada Inc. (2012), reforça esta abordagem. O tribunal concluiu que uma empresa não deve ser considerada beneficiário efetivo se atuar meramente como intermediária, sem (qualquer) discricionariedade no uso dos rendimentos.

A Importância da Substância Económica em contexto de partes relacionadas

A autodeterminação e a substância económica da entidade são, portanto, cruciais. Em todos os casos mencionados, há uma constante: estamos a lidar com partes relacionadas.

Entidades relacionadas, no contexto internacional, são vistas como partes de um “consolidado fiscal” internacional, onde uma entidade pode ser responsabilizada pela situação fiscal de outra por se presumir conhecimento transversal das motivações e índole de cada entidade.

Estas entidades são presumivelmente … cúmplices. Neste contexto, numa situação de substitutos tributários (em Portugal), a diligência exigida para aplicar uma dispensa de retenção na fonte já não se limita a obter um certificado de residência fiscal do beneficiário do rendimento.

Face a este panorama, assegurar a devida substância económica e compreensão do conceito de beneficiário efetivo é essencial para evitar riscos fiscais e legais.

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