Ir para o conteúdo principal

Resolução do Parlamento Europeu sobre contratos públicos

ALERTA LEGAL — 20 de outubro de 2025

No passado dia 9 de setembro, foi publicada a Resolução do Parlamento Europeu P10_TA(2025)0174, com o objetivo de reforçar a contratação pública na União Europeia como instrumento estratégico, sustentável e inovador.

A Resolução visa modernizar o quadro jurídico vigente, simplificar os procedimentos, promover a participação das PME e start-ups, valorizar critérios sociais e ambientais, e fortalecer a resiliência industrial e a autonomia estratégica europeia, garantindo simultaneamente transparência, concorrência leal e melhor utilização dos fundos públicos.

Contexto da Resolução do Parlamento Europeu sobre Contratos Públicos

  • Peso económico e relevância estratégica: os contratos públicos representam cerca de 14% do PIB da UE, sendo essenciais para crescimento sustentável, inovação, coesão social e criação de emprego de qualidade, com impacto direto nas PME e na indústria local.
  • Desafios existentes desde a reforma de 2014: mantêm-se procedimentos complexos, requisitos jurídicos exigentes e encargos administrativos desproporcionais, sobretudo para autoridades locais e regionais, resultando em atrasos, dependência de subcontratação e pressão financeira acrescida.
  • Predomínio do critério do preço mais baixo: a adjudicação baseada apenas no preço limita a qualidade e inovação, aumenta o risco de trabalho não declarado e penaliza empresas que cumprem a legislação laboral e social.
  • Concorrência e transparência em risco: há redução da concorrência efetiva e fragilidades nos mecanismos de controlo e supervisão, pondo em causa a confiança pública que poderá originar situações de corrupção.
  • Sustentabilidade e valor acrescentado europeu: a contratação pública deve valorizar critérios sociais, ambientais e qualitativos, privilegiar propostas com valor gerado na UE e reforçar a resiliência industrial e autonomia estratégica.
  • Digitalização e simplificação: a Resolução apela à digitalização harmonizada e segura, com plataformas acessíveis e menos burocracias, permitindo maior participação das PME.

Objetivos estratégicos

  • Pilar do mercado interno e da economia europeia: a contratação pública deve apoiar crescimento económico e investimento público eficiente, com reformas ambiciosas para libertar o potencial do setor e harmonizar regras entre Estados-Membros.
  • Competitividade e resiliência industrial europeia: reforço da autonomia estratégica, incentivo à produção de bens e serviços europeus em setores críticos e promoção de inovação e sustentabilidade.
  • Simplificação e clareza regulatória: redução da complexidade atual, tornando o quadro legislativo mais acessível a PME, start-ups e entidades da economia social.
  • Contratação pública sustentável e social: integração de objetivos de sustentabilidade, inovação, resiliência e direitos humanos, assegurando concorrência leal, eliminação de encargos excessivos e valorização do ciclo de vida.
  • Apoio às PME e economia local: processos redesenhados para favorecer participação das PME, reduzir burocracia e reforçar desenvolvimento económico local.
  • Princípios orientadores: boa gestão de recursos públicos, concorrência leal e medidas robustas anticorrupção e de transparência.
  • Equilíbrio entre abertura e proteção: regras claras para operadores de países terceiros, permitindo preferência europeia em setores estratégicos compatível com obrigações da OMC.
  • Flexibilidade e segurança jurídica: maior segurança jurídica e flexibilidade às autoridades adjudicantes, garantindo eficiência e previsibilidade.
  • Contratação pública como instrumento de valor público: assegurar melhor relação qualidade/preço e transparência na utilização de fundos públicos.

Recomendações da Resolução

O Parlamento Europeu pretende simplificar a contratação pública através de uma revisão profunda ao quadro jurídico com o objetivo de torná-lo mais eficiente, sustentável e competitivo, com foco na simplificação de procedimentos e harmonização digital entre Estados-Membros:

✓ Sustentabilidade e inovação:

  • Incentivo a soluções inovadoras e sustentáveis, capazes de gerar desenvolvimento económico.
  • Introdução de critérios de sustentabilidade harmonizados em todos os Estados-Membros, alinhados com a legislação da UE.
  • Criação de critérios setoriais específicos e metodologias de verificação comuns.
  • Integração da sustentabilidade no princípio da proposta economicamente mais vantajosa (MEAT).
  • Reforço do mercado de materiais secundários e tecnologias verdes europeias.
  • Garantia de que as exigências não geram custos desproporcionados nem distorcem a concorrência.

✓ Preferência europeia e resiliência industrial

  • Avaliação de mecanismos que valorizem produtos e serviços de origem europeia em setores estratégicos, sem protecionismo.
  • Promoção de parcerias industriais dentro da UE em projetos estratégicos (infraestruturas críticas, tecnologias avançadas, matérias-primas essenciais).
  • Garantia de transferência de tecnologia, saber-fazer e competências para entidades estabelecidas na UE.

✓ Modernização e coerência setorial

  • Simplificação dos procedimentos para operadores da rede elétrica e maior coerência regulatória.
  • Revisão do quadro de contratos de concessão, equilibrando duração, investimento e viabilidade económica.
  • Atualização contínua dos critérios técnicos frente à evolução tecnológica e geopolítica.
  • Alinhamento com o Regulamento Indústria de Impacto Zero (UE 2024/1735), reforçando resiliência e segurança do aprovisionamento.

✓ Redução da burocracia e apoio às PME

  • Eliminação de encargos administrativos desnecessários.
  • Programas de assistência técnica e capacitação para pequenos operadores.
  • Simplificação de critérios de seleção e criação de base de dados europeia de PME pré-qualificadas.
  • Divisão de contratos em lotes menores sempre que tecnicamente viável.
  • Flexibilização dos critérios de qualificação e aceitação de provas em fases posteriores.
  • Aplicação coerente do princípio da declaração única.

✓ Digitalização e inteligência artificial

  • Redução de custos e prazos, maior transparência e rastreabilidade.
  • Interoperabilidade entre bases de dados nacionais.
  • Uso de IA e análise avançada de dados para detetar conluios e fraudes.
  • Criação de quadros síntese com resumos acessíveis dos concursos públicos.

✓ Ética, integridade e responsabilidade social

  • Reforço de critérios de exclusão por corrupção, fraude ou violação de direitos laborais/ambientais.
  • Responsabilidade solidária entre contratantes e subcontratantes.
  • Maior controlo sobre subcontratação e condições laborais justas.
  • Valorização de contratos reservados para empresas sociais e entidades sem fins lucrativos.

✓ Inovação contratual e flexibilidade de execução

  • Admissão de propostas variantes para fomentar inovação (atualização do artigo 45.º da Diretiva 2014/24/UE).
  • Ajuste de preços e prazos contratuais devido a problemas como a inflação, custos energéticos ou alterações legais.
  • Reforço de mecanismos de pagamento direto a subcontratantes.

✓ Formação e profissionalização dos adquirentes públicos

  • Programas de formação a nível da UE.
  • Critérios ambientais e sociais “prontos a utilizar”.
  • Partilha de boas práticas nacionais.
  • Integração do saber-fazer empresarial no planeamento e execução contratual.

✓ Concorrência leal e atualização regulatória

  • Reforço de instrumentos de controlo da concorrência.
  • Modernização de metodologias de análise de mercado.
  • Uso de IA para promover concorrência justa, transparência e valor estratégico.

Em conclusão, importa referir que, esta Resolução do Parlamento Europeu estabelece as bases para um quadro jurídico de contratação pública mais coerente e eficaz, assegurando a integração dos princípios da sustentabilidade, da inovação e da concorrência na execução das políticas públicas.

Em suma, a Resolução traduz uma evolução do paradigma jurídico, que passa a privilegiar valor estratégico e sustentabilidade, sem nunca comprometer os princípios basilares da contratação pública, tais como, os princípios da concorrência, transparência e igualdade.

O sucesso desta reforma dependerá, contudo, da transposição e aplicação harmonizada pelas autoridades nacionais, garantindo simplificação procedimental, segurança jurídica e efetivo acesso das PME ao mercado.